quinta-feira, dezembro 16

Os olhos do diabo

Não me tinha apercebido. Finda a leitura d'"O Retrato de Dorian Gray" descobri que a beleza da alma e a beleza do corpo não estão tão distantes uma da outra quanto isso; descobri que existem as marcas do tempo e as marcas do pecado, e que ambas se repercutem no corpo. Não me refiro às marcas do pecado segundo os cânones da Igreja Católica, nem aos pecados mortais. Refiro-me ao pecado como aquilo que sabemos estar errado. Quando fazemos, por convicção, algo que sabemos errado, tiramos dessa acção um prazer muito mordaz. Um prazer que nos é incutido no brilho dos olhos e no trejeito da boca, para todo o sempre, tal comos os sulcos que o tempo cava na nossa testa.

Gosto dos olhos. Não são sequer olhos se não forem mais que rostos. Olhem bem nos olhos. Verão nele representada toda a alma do opositor. O que se arrepende do seu grave erro terá nos seus olhos a marca eterna do seu arrependimento. São olhos baixos; ou olham o chão ou olham o alto de cabeça vergada. Os olhos dos que, errando, não mostram remorsos pelo seu delito, têm então os olhos inundados de prazer. Parecem os olhos do diabo - e nem temos conhecimento de como tem o diabo os olhos. São olhos que brilham e luzem, são olhos que se riem, não com um riso alegre e cristalino mas com um riso de prazer sádico e mordaz.